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Um processo de reformulação que se inicia pelo fim

por Rafael Almada

A felicidade de retornar ao Instituto Federal do Rio de Janeiro-IFRJ, depois de longo aprendizado em gestão pública de educação na Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação, rapidamente já se transforma em preocupação e percepção de que este Instituto possui gestores que pensam e agem sem planejamento. E além de não planejar, também não compartilham com a comunidade o que pensam e a forma que agem.

Vejam só. Na última sexta-feira, dia 16 de setembro de 2016, a Pró-reitoria de Ensino Médio e Técnico tenta esclarecer um processo de reformulação dos cursos integrados de Química do IFRJ por meio do Memorando n.º 090/2016. E após leitura e releitura, percebe-se que o esclarecimento somente contribui na nossa certeza de que este processo está invertido e se inicia pelo fim, se cria a proposta, não enfrenta os reais problemas do curso técnico integrado e depois, se der tempo claro, a comunidade contribui com a reformulação. Vamos então aos fatos, erros e aos reais problemas.

O primeiro erro, é quem deve liderar o processo. No documento supracitado, ressaltam que os prazos estabelecidos e liderança deste processo são de responsabilidade da Proet, mas nós sabemos que no Art. 17 do Regimento geral do IFRJ compete ao Conselho Acadêmico do Ensino Médio e Técnico – CAET “avaliar propostas de criação e extinção de cursos, bem como sugerir medidas de atualização e de reformulação curricular dos cursos vigentes, encaminhando parecer didático-pedagógico”. Contudo, observa-se nas atas e pauta do CAET a ausência desta discussão, apenas na última reunião por solicitação dos professores do Campus Rio de janeiro foi solicitado explicações sobre esta reformulação. A lógica deveria ser o CAET iniciar a discussão, encaminhar e planejar um calendário e chamar a comunidade para contribuir por execução das atividades pela Proet.

O segundo erro, são as justificativas da legislação para a velocidade dos prazos. Vamos então falar delas, a principal citada é a Portaria n. º 25, de 13 de agosto de 2015, que define conceitos e estabelece fatores para fins de cálculo dos indicadores de gestão das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica – EPCT. Este documento não define prazos e não indica reformulação, apenas são conceitos e ainda cita a Lei nº 13.005/2014 e a Portaria MEC nº 818/2015.

A Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação – PNE, possui duas estratégias que afetam diretamente os Institutos Federais- IFs, que é a “Meta 10: oferecer, no mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) das matrículas de educação de jovens e adultos, nos ensinos fundamental e médio, na forma integrada à educação profissional” e a “Meta 11: triplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio, assegurando a qualidade da oferta e pelo menos 50% (cinquenta por cento) da expansão no segmento público”. Na estratégia 11.11 destaca-se a relação de alunos por professor para 20 (vinte), entretanto,  já no art. 1 se apresenta a vigência de 10 (dez) anos, a contar da publicação da Lei, de forma a alcançar as metas até 2024. Há um longo prazo ainda.

Na Portaria n. º 818, de 13 de agosto de 2015, que regulamenta o conceito de Aluno-Equivalente e de Relação Aluno por Professor, no âmbito da Rede Federal EPCT. Esta Portaria novamente não define prazo, apenas conceitos.

Portaria Setec/MEC n° 17, de 11 de maio de 2016, que estabelece diretrizes gerais para a regulamentação das atividades docentes no âmbito da Rede Federal de EPCT cita no §3 do Art. 12, que a avaliação da relação de alunos por professor (RAP) a que se refere a Lei nº 13.005/2014 terá sua cobrança as instituições a partir de 18 (dezoito) meses da data de publicação da Portaria. Em outra a palavras, os IFs possuem o prazo até novembro de 2017 para adequar e reformular seus cursos.

Há ainda o Documento Base para a promoção da formação integral, fortalecimento do ensino médio integrado e implementação do currículo integrado no âmbito das Instituições da Rede EPCT conforme Lei 11.892/2008, desenvolvido pelo Fórum de Pró-reitores de Ensino – FDE que considera como prioridade Institucional a promoção e desenvolvimento da formação integral dos educandos por meio do Currículo integrado no Ensino Médio Integrado na Rede EPCT. O Documento utiliza-se dos princípios definidos na Resolução CNE nº06/2012.

A Resolução nº 6, de 20 de setembro de 2012, define Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio. Neste documento há um conjunto articulado de princípios e critérios a serem observados pelos sistemas de ensino e pelas instituições de ensino públicas e privadas, na organização e no planejamento, desenvolvimento e avaliação da Educação Profissional Técnica de Nível Médio, inclusive fazendo uso da certificação profissional de cursos. Não há prazos nesta resolução. Um fator importante neste documento é a definição da organização curricular dos cursos técnicos, em todas as suas modalidade e formas, será organizada por três núcleos: núcleo tecnológico, núcleo básico e o núcleo politécnico.

Em resumo, os prazos que exigiriam cobrança de possível reformulação é novembro de 2017 para Portaria n. º 17/2016 e o ano de 2024 para atender as metas da lei n.º 13.005/2014. Em relação o orçamento dos IFs, para o ano de 2017 não foi utilizado os conceito de aluno-equivalente e será utilizado apenas em 2018.

O terceiro erro, é a metodologia adotada para um debate que envolve todos.  Para reformulação do curso técnico em química, a Proet apresenta um prazo curto, reuni com diretores de ensino dos Campi Rio de Janeiro, São Gonçalo, Nilópolis e Duque de Caxias para “elaborar proposta base que subsidiassem uma discussão posterior com a comunidade escolar”, reune com alguns coordenadores dos cursos com o intuito de apresentar as “referidas propostas base”.  E, neste calendário marca uma agenda para o dia 29 de setembro de 2016, ampliado por solicitação nossa pois a data era em 22 de setembro de 2016, para finalizar “a nova proposta de organização curricular”. E ainda, reforça ao final do memorando, que a metodologia estabelecida prevê que as propostas e estudos primeiramente fiquem restritas a Proet, Diretores e Coordenadores.

A metodologia que nasce errada, não pode dar certo. Em outras palavras, significa que os professores, técnicos e estudantes somente poderão participar quando já finalizada as propostas, com um olhar apenas em números, cargas horárias e sem pensar a articulação entre o ensino profissional e a educação básica. E mais, a base da proposta vai orientar a discussão se limitando ao trabalho e debate na comunidade, expresso ao final do memorando: “as etapas até aqui completadas objetivam apresentação de propostas da base e modelos que orientem a posterior discussão”.

Para reformular com qualidade precisamos pensar no curso integrado, analisar os indicadores, olhar as pessoas, ampliar nossos conceitos sobre núcleo comum e disciplinas técnicas e fortalecer a formação humana, cidadã e ética dos nosso técnicos. E assim, precisamos fazer algumas perguntas:

  • Será que estamos dispostos a este debate amplo na reformulação dos cursos integrados neste momento?

  • Será que apressar os prazos não são desculpas para reduzirmos nosso enfrentamento dos reais problemas que temos e vivenciamos no curso técnico?

  • Será que não estamos utilizando-se de indicadores negativos para não realizar o real debate na EPT?

  • Será que criar propostas base focada em cargas horárias apenas e deixar a comunidade contribuir depois, principalmente os estudantes, não é uma forma de limitar e direcionar a discussão com “o que querem” e não com “o que nós queremos”?

 

Nossa responsabilidade neste momento como educadores está no desafio de elaborar uma política que supere essa dicotomia entre conhecimentos específicos e gerais, entre ensino médio e educação profissional. Muita gente já trabalhou, brigou e lutou nos segmentos da sociedade com o intuito de discutir nossa proposta atual de uma política que recuperasse o que o estrago do Decreto nº.2.208/1997  que coibia a possibilidade da integração da formação básica e profissional de forma orgânica num mesmo currículo. O debate sobre a mudança na legislação, uma reivindicação dos educadores progressistas nos tenebrosos anos dos governos FHC, foram superados com o Decreto nº. 5.154/2004.

Não há dúvida que a atual gestão da Proet é muito superior em qualidade e diálogo do que a anterior do início desta gestão da Reitoria, pois ocorreu uma mudança de atuação e de iniciativa. Contudo, esta metodologia equivocada que restringe a discussão, menospreza os conselhos acadêmicos e não planeja de forma a discutir com a comunidade não é característica da Proet, mas da atual gestão da reitoria, que por si, já contamina as boas ideias na Proet.

A metodologia deveria ser iniciada com o debate no CAET, promoção de um calendário de discussão nos campi com discussão das equipes lideradas pelas direções de ensino, ouvir os estudantes e suas vivências, de forma a debruçar sobre as ementas das disciplinas com um olhar de articulação entre ensino médio e técnico. Depois deste diálogo, que se poderia criar uma matriz com reduções ou ampliações de cargas horárias, para serem iniciadas em 2018.

Se queremos realmente enfrentar os problemas no processo de reformulação dos cursos integrados de Química do IFRJ, precisamos planejar e dar voz aos conselhos, aos estudantes, aos professores e aos técnicos. Chega de maquiar números, culpar o MEC, se omitir e deixar que façamos tudo sem planejar. Não há possibilidade de iniciar e reformular sem o debate amplo e planejado. A hora é agora. Vamos ao debate?

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